PÃO E CIRCO
Antigamente eu chegava a montar três espetáculos por ano. Ultimamente monto um a cada três. Segundo Yve, quando alguém fica falando do passado é porque está velho. Posso até estar velho, mas não é isso que me faz falar do antigamente. Assim como Paulo, adoro a minha profissão, mas não sinto mais prazer em exercitá-la. Assim como Paulo, dei minha vida ao meu mister... e cansei. Não dá para sentir prazer convivendo com quem não nos ama. Eu amo esta cidade, mas a recíproca não é verdadeira. Não só a mim, mas aos artistas de um modo geral. As reflexões de Adriano sobre o desprazer de ensinar vão ao encontro do contexto cultural em que vivemos. Não por culpa deste ou daquele governo, mas o paradigma neoliberal levou o ser humano ao máximo da comunicação para não se comunicar. E neste contexto a arte não tem vez. Assim como Paulo, nós artistas vivemos uma situação caótica. Estou velho sim, de futuro... Mas persisto.
Estas foram as minhas palavras para o programa da peça “Meu Querido Diário”. Como era de se esperar, dos poucos que a ele tiveram acesso, a maioria não se importou. Uns gostaram, outros se surpreenderam, pois não esperavam que eu fosse capaz de ter esse sentimento com relação à cidade. Alguns outros acharam que eu peguei pesado, que passei recibo. Peguei pesado com quem, com o quê, se a realidade dos fatos só faz corroborar as palavras acima? Se o público pagante foi tão escasso que nem deu pra cobrir as despesas contraídas com a montagem, quanto mais ter lucro? Todo mundo parabe-nizou, elogiou, se ufanou, até, de nos ter como conhecidos. Mas passar na bilheteria do teatro, adquirir seu ingresso e assistir ao espetáculo, que é bom, nada. Disto, a grande maioria dos que se dizem amigos, ou mesmo fãs, não foi capaz. E muitos dos convidados só compareceram depois de muita insistência. E olha que o espetáculo, elogiadíssimo pela crítica, é uma comédia pra lá de hilária.
“O campista pede, mas não quer”, me disse Silvinha Salgado após assisti-lo. É fato! Pedir, para o campista, não passa de uma força de expressão, pois tudo o que realmente quer ele tem. Só que o que ele verdadeiramente tem é que é a questão. Podemos perceber pela felicidade transparente que lota os bares da cidade, dos sofisticados aos periféricos, que o campista está muito satisfeito com o que possui. Que vive qual criança num playground, que adora ser personagem de um teatro de fantoches. Onde o lazer cultural se faz desnecessário, na medida em que fazem de sua vida uma farsa. “Meu Deus, de onde essa gente tira tanta felicidade”, diz em determinado momento o personagem da peça, ao relatar a passagem de um trio elétrico arrastando uma multidão, que mais parece uma fuga em massa num filme catástrofe. Assim fomos acostumados. E prenhes de felicidade entendemos a ida ao teatro como desnecessária. Parece até que aquela campanha “Vá ao teatro” aqui foi cunhada ao contrário.
No último domingo de apresentação da peça, uma professora de um colégio estadual me questionou sobre o que eu havia escrito no programa. Tentava me convencer de que o ato de amar se basta em si. Que amar não precisa, necessariamente, de correspondência, e que educar é um ato de amor. Contrargumentando fiz vê-la que amar sem correspondência é sofrimento e se este sofrer gera prazer é masoquismo. Perguntei-lhe há quanto tempo ela dava aula, ela respondeu-me que há muito e que estava cansada de ir pra sala de aula, que ia obrigada e que não via a hora de se aposentar. Respondi-lhe que a minha situação era idêntica e por isso escrevi o que escrevi, e que após a peça voltaríamos a conversar. Reparei que ela riu muito ao se ver refletida no palco, mas nem participar do debate ela participou. O texto de Adriano provocara-lhe um riso nervoso e quem sabe uma revisão no seu conceito sobre o ato de amar, pois saiu do teatro sem que eu ao menos percebesse.
Até o momento, apenas duas montagens locais inéditas ocorreram este ano na cidade. Enquanto que semanalmente uma enxurrada de espetáculos caça-níqueis, integrados por elencos oriundos de “Zorra Total” ocupa o Trianon, com sucesso de público, é claro. Se é isto que o povo quer, é o que temos que dá-lo, como na velha Roma: pão e circo. “Infelizmente”, quando optei pelo teatro como profissão, o entendi como arte, como um meio de expressar meu sentimento do mundo, e não como uma possibilidade de se ganhar dinheiro através do riso fácil e alienante. O fiz consciente, de que seria a minha tribuna, a minha trincheira e também uma forma de propiciar prazer às pessoas. Mas se não é esta a sua missão, se com ele não posso contribuir para o crescimento da minha aldeia, chego à conclusão tardia de que escolhi a profissão errada. Mas como agora é tarde, persisto.
Estas foram as minhas palavras para o programa da peça “Meu Querido Diário”. Como era de se esperar, dos poucos que a ele tiveram acesso, a maioria não se importou. Uns gostaram, outros se surpreenderam, pois não esperavam que eu fosse capaz de ter esse sentimento com relação à cidade. Alguns outros acharam que eu peguei pesado, que passei recibo. Peguei pesado com quem, com o quê, se a realidade dos fatos só faz corroborar as palavras acima? Se o público pagante foi tão escasso que nem deu pra cobrir as despesas contraídas com a montagem, quanto mais ter lucro? Todo mundo parabe-nizou, elogiou, se ufanou, até, de nos ter como conhecidos. Mas passar na bilheteria do teatro, adquirir seu ingresso e assistir ao espetáculo, que é bom, nada. Disto, a grande maioria dos que se dizem amigos, ou mesmo fãs, não foi capaz. E muitos dos convidados só compareceram depois de muita insistência. E olha que o espetáculo, elogiadíssimo pela crítica, é uma comédia pra lá de hilária.
“O campista pede, mas não quer”, me disse Silvinha Salgado após assisti-lo. É fato! Pedir, para o campista, não passa de uma força de expressão, pois tudo o que realmente quer ele tem. Só que o que ele verdadeiramente tem é que é a questão. Podemos perceber pela felicidade transparente que lota os bares da cidade, dos sofisticados aos periféricos, que o campista está muito satisfeito com o que possui. Que vive qual criança num playground, que adora ser personagem de um teatro de fantoches. Onde o lazer cultural se faz desnecessário, na medida em que fazem de sua vida uma farsa. “Meu Deus, de onde essa gente tira tanta felicidade”, diz em determinado momento o personagem da peça, ao relatar a passagem de um trio elétrico arrastando uma multidão, que mais parece uma fuga em massa num filme catástrofe. Assim fomos acostumados. E prenhes de felicidade entendemos a ida ao teatro como desnecessária. Parece até que aquela campanha “Vá ao teatro” aqui foi cunhada ao contrário.
No último domingo de apresentação da peça, uma professora de um colégio estadual me questionou sobre o que eu havia escrito no programa. Tentava me convencer de que o ato de amar se basta em si. Que amar não precisa, necessariamente, de correspondência, e que educar é um ato de amor. Contrargumentando fiz vê-la que amar sem correspondência é sofrimento e se este sofrer gera prazer é masoquismo. Perguntei-lhe há quanto tempo ela dava aula, ela respondeu-me que há muito e que estava cansada de ir pra sala de aula, que ia obrigada e que não via a hora de se aposentar. Respondi-lhe que a minha situação era idêntica e por isso escrevi o que escrevi, e que após a peça voltaríamos a conversar. Reparei que ela riu muito ao se ver refletida no palco, mas nem participar do debate ela participou. O texto de Adriano provocara-lhe um riso nervoso e quem sabe uma revisão no seu conceito sobre o ato de amar, pois saiu do teatro sem que eu ao menos percebesse.
Até o momento, apenas duas montagens locais inéditas ocorreram este ano na cidade. Enquanto que semanalmente uma enxurrada de espetáculos caça-níqueis, integrados por elencos oriundos de “Zorra Total” ocupa o Trianon, com sucesso de público, é claro. Se é isto que o povo quer, é o que temos que dá-lo, como na velha Roma: pão e circo. “Infelizmente”, quando optei pelo teatro como profissão, o entendi como arte, como um meio de expressar meu sentimento do mundo, e não como uma possibilidade de se ganhar dinheiro através do riso fácil e alienante. O fiz consciente, de que seria a minha tribuna, a minha trincheira e também uma forma de propiciar prazer às pessoas. Mas se não é esta a sua missão, se com ele não posso contribuir para o crescimento da minha aldeia, chego à conclusão tardia de que escolhi a profissão errada. Mas como agora é tarde, persisto.
Antônio Roberto Góis Cavalcanti(Kapi)
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